II
Havia, portanto, uma cidade
onde os nossos corpos se cansavamsofregamente de ser jovens.
Recomeçava, de cada vez, a morte.
Sabíamo‑lo. A regra, porém,
é antes esquecer, ficar. Como poderia
levar‑vos a mal? De um lado vocês
e a vida — e eu nesse outro em que se
não vive nem morre a demora de estar ainda.
Atravesso o jardim do Cartaxo
como um estrangeiro, alguém
que não viu as garrafas partirem‑se
contra a madrugada — e, se acendo
um charro, partilho‑o com as paredes,
esqueço‑me de que tenho mãos.
Pedro, Paulo — onde quer que estejam —,
eu sei que dizer muito baixinho
la muy hermosa é o suficiente para que
o paraíso reabra e o inferno (o mesmo)
se torne de novo possível. Contornando
o bilhar russo, o Carlos traz‑nos
mais três ginjas, um sorriso com sotaque,
o céu estrelado que nos mata.
A seguir, bem sabem, pago eu.
Manuel de Freitas
in Sunny Bar, com sel. de Rui Pires Cabral, posfácio de Silvina Rodrigues Lopes,
capa de Luís Henriques e arranjo gráfico de Pedro Santos,
Lisboa: Alambique, 2015
capa de Luís Henriques e arranjo gráfico de Pedro Santos,
Lisboa: Alambique, 2015
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