sábado, 11 de julho de 2015

POMPE INUTILI


                             a Silvina Rodrigues Lopes


Nessuno nasce; sarebbe uno sproposito
chiamare qualcuno i residui
di placenta che avvolgono
un insieme di organi
a tutto o quasi a tutto predisposti.

Solo i morti, veramente,
esistono. Che abbiano scritto o non
abbiano scritto libri, lettere d'amore,
diari. Non importa: li abbiamo
incrociati, a volte si sono seduti
allo stesso tavolo, hanno persino creduto
nel tenero supplizio dell'amore.
E avevano mani reali, nel toccare
il viso imberbe da cui si congedavano.
Un bacio, soltanto sulle rughe,
riusciva a rendere meno freddi i mattini.

Si congedano molto male, i morti.
Sebbene, per una volta, siano
esatti e sinceri – nel momento
in cui scendono nella terra e ci impediscono
di condividere con loro una sigaretta,
l'ultimo bicchiere, una specie di destino.

Sono terribilmente reali, i morti.
La vita intera non basta
perché si possa ucciderli tutti,
uno ad uno, come di certo consiglierebbe
la più elementre igiene metafisica.
Ci danno, tuttavia, la forza necessaria
per morire sempre di più, tollerando
giorni in affitto, case leggermente
inabitabili. Perché gli altri, in
verità, non sono altro che morti imperfetti.
Sono, come noi, un po' troppo vivi.

Forse un giorno, però, potranno
firmare una poesia così (e può anche non essere
una poesia, molto meno così), in cui si noti,
oltre alle influenze ovvie, una certa
– diciamo – specializzazione nell'orrore.
Perché è solo di questo che si tratta.

I morti lo sanno.
La saggezza è inutile.
La poesia anche.


*


para a Silvina Rodrigues Lopes


Ninguém nasce; seria descabido
chamar alguém aos resíduos
de placenta que envolvem
um conjunto de órgãos
a tudo ou quase tudo predispostos.

Só os mortos, verdadeiramente,
existem. Escreveram ou não
escreveram livros, cartas de amor,
diários. Não importa: cruzaram-se
connosco, sentaram-se por vezes
à mesma mesa, acreditaram até
no terno suplício do amor.
E tinham mãos reais, ao tocarem
o rosto imberbe de que se despediam.
Um beijo, sobre rugas apenas,
conseguia tornar menos frias as manhãs.

Despedem-se muito mal, os mortos.
Embora, por uma vez, sejam
exactos e sinceros – no momento
em que descem à terra e nos impedem
de partilhar com eles um cigarro,
o último copo, uma espécie de destino.

São terrivelmente reais, os mortos.
A vida inteira não chega
para que possamos matá-los a todos,
um a um, como decerto aconselharia
a mais elementar higiene metafísica.
Dão-nos, contudo, a força necessária
para morrer cada vez mais, tolerando
dias de aluguer, casas ligeiramente
inabitáveis. Porque os outros, na
verdade, não passam de mortos imperfeitos.
Estão, como nós, um pouco demasiado vivos.

Talvez um dia, porém, venham a
assinar um poema assim (e pode até não ser
um poema, muito menos assim), em que se note,
além das influências óbvias, uma certa
– digamos – especialização no horror.
Pois é disso apenas que se trata.

Os mortos sabem-no.
A sabedoria é inútil.
A poesia também.


- Manuel de Freitas
traduzido por Daniela Di Pasquale

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